Por: Thales Tácito
Se tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando, falei muitas vezes como um palhaço mas jamais duvidei da seriedade da plateia que sorria.
Charles Chaplin
“TIRIRICA – Pior que tá não fica! – ou “fica” ?
Maluf, Roriz Garotinho, Jáder Barbalho,
Cássio Cunha Lima, Capiberibe e a “Lei do Ficha Limpa”
A Nulidade de votos no sistema proporcional
com a “Lei do Ficha Limpa” ou outra causa: diferença entre fase da AIRC(registro de candidatura) e a fase da AIME/RCD(após as eleições)
Por Thales Tácito Pontes Luz de Pádua Cerqueira
Promotor Eleitoral – Autor com sua esposa das recentes obras “Reformas Eleitorais Comentadas” e “Direito Eleitoral Esquematizado”, Saraiva, 2010.
As eleições de 2010 foram regidas pela completa insegurança jurídica, pela “maldição eleitoral” da violação do artigo 16 da CF/88. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tiveram registro negado 1.248 políticos de um total de 22.555 - considerando todos os mandatos em disputa. Nem todos os impugnados têm problemas nos tribunais. Muitos foram barrados porque não exibiram documentação em ordem à Justiça Eleitoral.
Conforme nossa posição, o TSE, data venia, equivocou-se ao retroagir a LC 135/2010, causando por arrastamento toda a insegurança jurídica vista internacionalmente no processo eleitoral, levando o STF a ficar numa “sinuca de bico”, se complicando ainda mais no Recurso Extraordinário 630.147 (Caso Roriz), pelo empate de 5 a 5 e extinção do processo sem julgamento de mérito pela renúncia posterior de candidatura antes de proclamação do resultado para um indicativo nacional da aplicação ou não da polêmica lei do “ficha-limpa”.
“Profetizando” o que poderia acontecer em diversas palestras ministradas no País, disse que candidatos mais espertos poderiam, no caso de indecisão jurídica, renunciar a candidatura, colocar parentes e ainda fazê-lo, se eleição majoritária, em 30 dias antes do pleito, quando o programa de candidatos das urnas não poderiam ser alterados, votando o eleitor no substituído, indo os votos para o substituto.
E a confusão já se instaurou.
Na Câmara dos Deputados, considerando os resultados proclamados pelo TSE e TREs, sem considerar os candidatos que tiveram “zerados” os votos pela “teoria dos votos engavetados”, temos que o PT terá 88 cadeiras na Câmara dos Deputados, em 2006 eram 83. O PMDB vai ter 79, contra 89 em 2006 O PSDB, 53, sendo que em 2006 eram 66. O DEM 43, sendo que em 2006, quando era PFL tinha 65. O PP, 41, sendo que em 2006 eram 41 também. O PR, 41, sendo que em 2006 eram 23(quando era PL). O PSB, 34, sendo que em 2006 eram 27. Outros partidos juntos vão ocupar 134 vagas. Porém, algumas das vagas podem ser alteradas por causa do STF em relação à Ficha Limpa.
No caso de Garotinho, os seus 694.862 votos foram computados, por conta de liminar que obteve na recente “suspensão da inelegibilidade”(artigo 26-C da LC 64/90 com redação da LC 135/2010). Frise-se que neste caso, quatro partidos ganharão vagas na Câmara dos Deputados caso o ex-governador Anthony Garotinho (PR) seja considerado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em jogo, estão cinco cadeiras conquistadas pelo PR, com os 694.862 votos recebidos pelo candidato. Na fila de espera estão deputados que não conseguiram se reeleger, como Marcelo Itagiba (PSDB), Nelson Bornier (PMDB) e Edmilson Valentim (PC do B). O PR passaria de oito para três vagas, enquanto o mais beneficiado, passando de oito para dez cadeiras, seria o PMDB - partido já presidido por Garotinho e que hoje é um dos maiores “rivais” do ex-governador. No Rio de Janeiro, também ganhariam espaço na Câmara o PC do B (de um para dois parlamentares), o PSDB (de dois para três) e o PMN (que não tinha vaga e passaria a ter uma).
A expectativa do TSE é avaliar a inelegibilidade de Garotinho antes de sua diplomação, em dezembro. Em maio de 2010, o ex-governador foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) por abuso de poder econômico na eleição municipal de 2008, em Campos, no norte Fluminense. Pela decisão, ficará inelegível até 2011, mas ele conseguiu liminar no TSE para manter sua candidatura, conforme o artigo 26-C da LC 64/90(alterado pela LC 135/2010), logo, não lhe foi aplicada a “teoria dos votos engavetados”/votos zerados(artigo 16-A da LE, alterada pela Lei 12.034/2009), enquanto perdurar esta liminar.
Na mídia publicou-se que se Garotinho perder seus votos, o PR defenderá que os votos do ex-governador fiquem com o partido. "O voto e o mandato são do partido. A candidatura deveria ter sido cassada, se fosse o caso, antes das eleições", disse o secretário-geral do partido no Rio, Adroaldo Peixoto. Todavia, isto não ocorrerá, pois como vimos, se o TSE, porém, revogar a liminar(art. 26-C da LC 64/90) e indeferir o registro, poderá aplicar a teoria dos votos engavetados(artigo 16-A da LE) e neste caso os votos ficam nulos, recalcula o QE, QP e sobras eleitorais do RJ, assumindo novos deputados, ficando Garotinho aguardando do lado de fora do mandato até o STF decidir em eventual recurso extraordinário eleitoral.
Lado outro, Maluf[1] teve os 497.203 votos “zerados” ou “engavetados”, pelo artigo 16-A da LE(alterada pela Lei 12.034/2009), pois diferente de Garotinho, não buscou liminar no TSE da decisão do TRE-SP que o tornou inelegível pela Lei do Ficha Limpa.
Assim, o “Caso Maluf” depende da interpretação do STF da retroatividade da “Lei do Ficha Limpa”.
Como vimos, o TSE entendeu que a lei retroage por não ferir o artigo 16 da CF/88. O STF, no “Caso Roriz”(RE 630.147 ) ficou no empate de 5 a 5, quando houve extinção do processo pela renúncia de Roriz a concorrer ao mandato, sendo substituído por sua esposa. Portanto, se o STF, em nova provocação, entender que a Lei do Ficha Limpa não retroage, por força do artigo 16 da CF/88, neste caso os votos são devolvidos ao mesmo e recalcula-se todo o QE, QP e sobras, alterando[2] todo panorama inicial dado pelo TRE SP. Se o STF entende que a lei retroage, prevalece a decisão do TRE-SP e TSE, caso em que os votos são nulos e diplomam quem a Justiça Eleitoral inicialmente previu, pois os votos de Maluf permanecem “zerados” pela teoria dos votos engavetados.
Mudando de Casa Legislativa, no Senado Federal, nomes de peso não foram reconduzidos, como os ex-senadores do PSDB Tasso Jereissati(Ceará) e Arthur Virgílio(Amazonas), além do ex-senadores do DEM, Heráclito Fortes(Piauí) e Marco Maciel(Pernambuco).
A composição do Senado foi a seguinte: PMDB, 20, sendo que em 2006 eram 20 também. O PT, 13, sendo que em 2006 eram 11. O PSDB, 10, sendo que em 2006 eram 13. O DEM, 8, sendo que em 2006 eram 17. O PP, 5, sendo que em 2006 eram 1. O PTB, 4, sendo que em 2006 eram 4 também. O PR, 4, sendo que em 2006 eram 4 também. O PSB, 4, sendo que em 2006 eram 3. O PDT, 3, sendo que em 2006 eram 4. Outros partidos elegeram 10 senadores. Por conta da Lei do Ficha Limpa há candidatos aguardando decisão do STF se a mesma retroage e os atinge - Cássio Cunha Lima (PSDB da Paraíba), Jáder Barbalho (PMDB do Pará) e João Capiberibe (PSB do Amapá) – ou não retroage e permite suas diplomações, por força do artigo 16 da CF/88.
No caso do Senado, se o TSE mantiver o entendimento da retroatividade da lei do Ficha Limpa, por ser eleição majoritária, aplica-se o artigo 224 do CE, ou seja, tem que analisar se os votos dados aos senadores “ficha-suja”, considerados “nulos”, atinjam 50%+1(dos votos nulos, não se incluindo aqui os “nulos propriamente ditos”, chamados de “apolíticos”), caso em que far-se-á novas eleições no Estado, se isto ocorrer; mas se a nulidade da votação não atingir 50%+1 dos votos, assume o mais votado após o considerado “zerado”. Todavia, se o STF entender posteriormente pela não retroatividade da Lei do Ficha Limpa, por ferir o artigo 16 da CF/88, neste caso os senadores “zerados” recuperam os seus votos e assumem a vaga, ainda que no Senado outro tenha sido diplomado. Todavia, até decisão do STF, caso prevaleça a decisão do TSE, estes Senadores “zerados” aguardam do lado de fora do mandato. Por isto a pressa de julgar antes da diplomação, para evitar o “troca-troca” de diplomações.
Assim, a mídia televisiva, falada e escrita estão perplexas e perdidas. Não tem a menor noção das consequências jurídicas dos principais eleitos do País, com problemas na Justiça.
A confusão aumentou após entrevista do então Presidente do TSE, Min. Ricardo Lewandowski, para o Portal Globo[3], na qual abordada a nulidade dos votos atribuídos a candidato "ficha-suja" que concorrem "por sua própria conta e risco"(artigo 16-A da LE), uma misteriosa “profecia” sugeriu divergência na Corte Excelsa Eleitoral sobre o desfecho jurídico destes candidatossub judice com registro indeferido:
"A lei não foi derrubada no STF. O TSE continuará mantendo a sua jurisprudência de forma intocável. O candidato que teve o seu registro indeferido pode concorrer, pode fazer campanha, pode fazer propaganda e terá o seu número na urna eletrônica. Ele só não poderá chegar ao momento da diplomação no dia 17 de dezembro com o registro indeferido, porque se isso ocorrer ele não será diplomado e não tomará posse. Precisamos ainda decidir qual solução será dada. Se os votos serão considerados nulos, se serão computados para o partido ou para o candidato. Obviamente que se tiver o recurso deferido, vai para o candidato."
Será que o TSE pretende mudar o que a Lei 12.034/2009 criou, ou seja, o artigo 16-A da LE ?
Na nossa obra – “Reformas Eleitorais Comentadas”, Editora Saraiva, 2010, quando abordamos com profundidade a “teoria dos votos engavetados”, prevista no artigo 16-A da Lei 9.504/97(alterada pela Lei 12.034/2009), deixamos estampados a posição tradicional e teleológica que levou o legislador a adotar a posição da não contabilização para a legenda dos votos dados a candidato cujo registro venha a ser indeferido[4] após as eleições, ou seja, o artigo 16-A da LE derrogou[5] o artigo 175, §4º do CE que permitia o voto ir para legenda. O motivo ? Fica fácil adivinhar. Além dos “bastidores” contados em nossa obra é evidente que a legenda partidária não pode aproveitar dos votos dados a “ficha suja”, por força da “teoria do fruto da árvore envenenada”(“Fruits of the Poisonous Tree Doctrine”).
Assim, se a “árvore”(candidato que incide na lei do ficha limpa) está “envenenada”, os vícios da “planta são transmitidos aos seus frutos”. Em outras palavras, os vícios de uma determinada votação contamina os frutos que dela se originaram(votos para legenda), em aplicação analógica do artigo 5º, LVI da CF/88 e § 1º do novo art. 157 do CPP. Aliás, a origem desta teoria é Bíblica(Mateus 7: 17-20[6]), que foi adotada no meio jurídico pela primeira vez pela Suprema Corte Norte-Americana[7] e posteriormente na Suprema Corte Alemã.
No modelo anterior a L.12.034/2009, a situação jurídica do candidato era analisada pela Justiça Eleitoral no “momento da eleição” e não “no momento do indeferimento do registro”(leia-se, antes da eleição), a teor do artigo 175 do Código Eleitoral(§§3º e 4º). Desta forma, quando a decisão de falta de condição de elegibilidade ou a presença de uma “inelegibilidade preexistente” fosse proferida após a realização da eleição a que concorreu o candidato, os seus votos não eram declarados nulos, mas revertiam a favor da legenda, beneficiando outros candidatos do partido ou coligação, inclusive com a má-fé. Percebendo isto, um dos grandes Ministros do TSE, em bastidores contados na nossa obra “Reformas Eleitorais”, fez uma resolução especial, nos idos de 2004, sendo a teoria consagrada nas eleições de 2006 e 2008(arts. 150 e 152, §2º da Res. 22712/2008), na qual denominou-se no meio popular de “teoria dos votos engavetados” e no meio jurídico de “candidatos zerados” ou “nulidade de votos em registro indeferido”, porquanto até decisão do TSE(e não STF necessariamente - o que denominamos na obra de “trânsito em julgado ELEITORAL”) os votos ficariam nulos(“engavetados”): se fosse o registro deferido, os votos seriam resgatados e recalculado o QE, QP e sobras partidárias.
Mas se o registro não fosse deferido, mantendo-se o indeferimento, os votos permaneceriam nulos, assumindo aqueles candidatos indicados na proclamação do resultado da eleição, já que os candidatos indeferidos tinham os votos zerados no sistema eleitoral. Evidente que se o STF, em recurso extraordinário eleitoral mudasse posição do TSE, o candidato “zerado” teria seus votos devolvidos e mudava novamente a configuração das cadeiras, recalculando QE, QP e sobras, e isto poderia até mesmo tirar deputados ou vereadores já empossados, sem devolução de valores pela ”boa-fé administrativa”, já que o STF poderia decidir momentos depois da diplomação. Portanto, o candidato “zerado” não assume enquanto o TSE, num primeiro momento, não deferir o registro. Até decisão do STF, em eventual recurso extraordinário eleitoral que tenha prequestionamento e repercussão geral, este candidato “zerado” aguardaria do lado de fora do mandato. Desta forma, a posição do TSE é a “importante” para efeito do candidato poder aguardar dentro do mandato, se o registro for deferido, reformando o indeferimento de outra instância da Justiça Eleitoral.
Assim, apesar da Resolução 23.218/2010, em seu art. 147[8] não mencionar, como faziam as resoluções pretéritas, as teorias da “conta e risco” e dos “votos engavetados” de forma coesa e sim “nebulosa”, evidente que aplica-se a Lei 12.034/2009, que inovou com o artigo 16-A da Lei 9.504/97, dando tratamento especial e afastando o artigo 175, §4º do CE pelo critério da especialidade, na antinomia das leis(antinomia aparente de primeiro grau, porquanto é lei especial após lei considerada geral), ou seja, lei especial(Lei 12.034/2009) derrogou lei geral(Código Eleitoral), mas somente naquilo que é especial, ou seja,somente para casos de REGISTRO DE CANDIDATURA E EM INDEFERIMENTO DESTE.
Se o candidato Tiririca sofrer AIME por suposto analfabetismo, aplica-se ao mesmo a teoria dos votos engavetados ?
Não. A teoria dos votos engavetados somente se aplica para casos de INFEDERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA, VIA AIRC, e não no caso de AIJE, AIME OU RCD, pois nesta aplica-se o artigo 175, §4º do CE, direcionando os votos para legenda, em caso de cassação do mandato do titular, salvo se a hipótese for de abuso ou compra de voto, pois neste caso a legenda não pode ser beneficiada pela mesma “teoria dos frutos da árvore envenenada”.
Na eleição de 2010, o fenômeno de marketing “Tiririca” conseguiu sozinho(votos nominais) 1.353.820(segundo deputado federal mais votado da história do Pais, perdendo apenas para o finado Enéas Carneiro, do PRONA/SP).
Inicialmente não somos contrário ao ser humano por detrás do palhaço “Tiririca”, cuja história de vida de todo nordestino ou “sertanejo forte”(Euclides da Cunha) é digna de maiores elogios.
Seu exemplo apenas serve para mostrar que o sistema eleitoral precisa de reformas, pois permitir que o palhaço, ao invés do cidadão, faça campanha, denota um sério problema institucional, inclusive com repercussão internacional[9]. Porém, isto não dá direito de “ensinar eleitores” a não votar no candidato, às vésperas da eleição, quando o foco principal é uma reforma política.
Na verdade, enquanto o sistema permitir tal mazela, cujo sistema proporcional de listas abertas é somente aderido no Brasil e na Finlândia, evidente que os partidos aprenderam a usar de famosos para elevar o quociente eleitoral e partidário.
Exemplo disto foi o “Caso Enéas”, que com 1.573.642 votos(record nacional não batido por Tiririca) elegeu 5 cadeiras pelo QE e mais uma pela sobra(maior média), sendo o deputado mais votado da história, com um marketing inusitado. Ao operar a fusão PL + PRONA, formando o PR, este aprendeu o marketing ideal ao sistema proporcional e conseguiu êxito tanto na Câmara Federal quanto no Senado, conforme visto.
Podemos culpar o PR ? Claro que não. Evidente que o sistema está falido! Assim, discutir lista fechada(desde que com financiamento público de campanha), voto facultativo(se não for tido cláusula pétrea o voto obrigatório), fim das coligações para eleições proporcionais, sistema distrital misto(se não adotado proporcional de lista fechada) é fundamental para corrigir distorções.
Assim, seria injusto esquecer que um instituto defeituoso(sistema proporcional de lista aberta) apenas se regenerará quando prevaleça a atuação de seus elementos mais dignos. Os “maus” ou “cômicos” políticos hão de desaparecer quando os políticos inteligentes e devotados tiverem a coragem de alterar o sistema(reforma política), ainda que renunciando a benefício de outrem e se prejudicando.
O caso Tiririca: o total de votos válidos do Estado de SP foi de 21.317.327 (nominais em 18.643.703 + legenda em 2.673.624), sendo que, dividido por 70 cadeiras resultou num QE de 304.533,243. Como no QE devemos desprezar a fração, se igual ou inferior a 0,5, arredondando-a para 1, se superior, temos que nas eleições para deputado federal em SP o QE foi de 304.533.
Logo, Tiririca conseguiu 4 cadeiras no QP[10] somente com sua votação, ou seja, a sua cadeira e mais 3. E, conforme estudaremos neste capítulo, somados os demais votos de sua coligação, conseguiram mais cadeiras do QP e ainda cadeiras pelo critério da maior média.
Assim, com a sua votação, o candidato “Tiririca”, além de se eleger[11], conseguiu eleger pelo sistema proporcional, os deputados federais de sua coligação, ou seja, Otoniel Lima(PRB) com 95.971 votos, Delegado Protógenes[12](PC do B) com 94.906 votos e Vanderlei Siraque[13](PT) com 93.314 votos.
Notícias circularam na internet e na mídia no tocante a expressiva votação do palhaço Tiririca e o risco de perder o “mandato” por analfabetismo e por motivo criminal.
Denunciado, na esfera penal, por ainda não ter foro pela prerrogativa de função(que passará a ter quando diplomado deputado federal, junto ao STF), por crimes eleitorais(falsidade de documento particular e omissão – arts. 349 e 350 do CE), houve afirmação da denúncia de que houve falsidade, porquanto o mesmo seria analfabeto, conforme perícia inicial juntada em documento de próprio punho endereçado pelo candidato ao TRE-SP, atestando ser alfabetizado, além de omissão de bens na declaração feita para o Areópago Eleitoral Bandeirante, uma vez que em reportagem da revista “Época” declarou não ter bens por estar em nome de terceiros por força de “separação judicial”.
Porém, a seara eleitoral criminal nada tem relação com a seara eleitoral cível. Na primeira o critério é saber se há ou não foro pela prerrogativa de função. Não havendo, o Promotor Eleitoral(se crime eleitoral) ou Promotor de Justiça(crime comum estadual) ou Procurador da República(crime comum federal) é quem possuem atribuições junto a Justiça Eleitoral, Comum Estadual ou Comum Federal, respectivamente, de primeiro grau de jurisdição. Tendo foro o candidato, vai para o Tribunal previsto na CF/88.
Se condenado em segundo grau, fica inelegível por 8 anos por força do artigo 1º, I, “e” da LC 64/90, alterado pela LC 135/2010, porém, sem ação eleitoral hábil para desconstituir o mandato, uma vez que a AIME somente pode ser feita em 15 dias da diplomação, criando um “vácuo” de qual instrumento usar, ainda que pro força do artigo 26-C da LC 64/90, por força do artigo 55 da CF/88(conferir esta perplexidade na obra “Reformas Eleitorais Comentadas”, Saraiva, 2010). Assim, somente o trânsito poderia levar a aplicação da perda de mandato pelo artigo 55 da CF/88, além da suspensão dos direitos políticos e a própria inelegibilidade após a extinção da pena, sem margem a dúvida de que instrumento processual usar.
Por outro lado, na seara cível(questão do suposto analfabetismo de Tiririca) a competência se fixa pela eleição em curso: eleição municipal tem competência o Juiz Eleitoral e atribuição o Promotor Eleitoral; nas eleições gerais, o TRE, com atribuição do PRE e na eleição presidencial o TSE tem competência e o PGE tem atribuição.
Portanto, para análise de ações cíveis eleitorais, na eleição para deputado federal de Tiririca, compete ao TRE-SP, mediante provocação de candidato, partido político ou coligação – todos com interesse no pleito(“representatividade adequada”) - ou Procurador Regional Eleitoral de SP.
Na seara cível-eleitoral, tratando-se de analfabetismo, Tiririca deveria ser inicialmente impugnado via AIRC para poder ser aplicada as teorias da “conta e risco” e a “dos votos engavetados”(caso houvesse INDEFERIMENTO do registro). Não foi. Precluiu ? Não, por tratar-se de tema constitucional(artigo 259, parágrafo único do CE), logo, pode estar sujeito a AIME ou RCD(este, se houvesse prova pré-constituída). Mas em AIME e RCD não se aplica a teoria dos “votos engavetados” e sim:
(a) em eleições majoritárias - o artigo 224 do CE;
(b) eleição proporcional(no caso de Tiririca) - artigo 112 do CE(assunção de suplente, caso seja cassado o mandato do titular) ou, em casos especiais, o artigo 113 do CE c/c art. 56, §2º da CF/88(no caso de ausência de suplente), ou seja, o candidato Tiririca será diplomado, sofrerá AIME(15 dias da diplomação), os votos não serão “engavetados” ou “zerados”, ele permanecerá no mandato de deputado e somente se perder no TSE ou no STF(se o caso), é que será aplicado o artigo 112 do CE(assume o suplente) ou, se o caso, artigos 113 do CE c/c 56, §2º da CF/88(não existindo suplente e faltarem menos de 15 meses para nova eleição, fica sem deputado; se faltarem mais de 15 meses, far-se-á nova eleição para a vacância).
Portanto, em AIME ou RCD os candidatos que aproveitaram a “carona” da votação de Tiririca – leia-se, o sistema de coeficientes que permite cadeiras por votação conglobada - não serão prejudicados, porquanto a teoria dos “votos engavetados” não se lhes aplicam, porquanto se aplica somente para INDEFERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA enão em ações pós eleição, por força da soberania popular(neste caso os votos permanecem com a legenda ou coligação e apenas o titular, no caso, Tiririca, se cassado o mandato, pode ser substituído por suplente, porquanto a soberania popular do artigo 1º da CF/88 possui prevalência sobre lei ordinária). Assim, perdido o prazo da AIRC, as consequências de AIME ou RCD são completamente distintas, aproveitando-se o voto para legenda, aplicando, em suma, o artigo 175, §4º do CE.
Conclusão:
(a) na fase de registro de candidatura/antes das eleições(via AIRC), por exemplos “Caso Maluf”, “Caso Cássio Cunha Lima”, “Caso Jader Barbalho” e “Caso João Capiberibe”): se mantido o INDEFERIMENTO do registro, aplica-se a teoria dos votos engavetados e estes não vão para legenda – artigo 16-A da Lei 9.504/97. Se a eleição for majoritária(por exemplo, Senado), aplica-se o artigo 224 do CE(novas eleições ou assume o segundo mais votado)
Nota: o “Caso Garotinho”, como vimos, por força de liminar(suspensão de inelegibilidade – art. 26-C da LC 64/90) não sofreu os efeitos da teoria dos votos engavetados, ou seja, seus votos não foram “zerados” e sim computados. Mas se o TSE em recurso oriundo da decisão do TRE-RJ, indeferir o seu registro, neste caso aplicar-se-á a teoria, zerando seus votos e recalculando o QE, QP e sobras no RJ, alterando todo quadro, sendo que Garotinho terá que aguardar de lado de fora do mandato até decisão final do STF. Por isto, tanto TSE quanto STF devem ser céleres, julgando tudo antes da diplomação, evitando a completa “maldição eleitoral”;
(b) na fase posterior às eleições(AIME/RCD), por exemplo, Caso Tiririca”: não se aplica o artigo 16-A da LE e sim o 175, §4º do CE, por força do artigo 1º da CF/88 – os votos vão para legenda, atingindo somente o titular com problema, que perde o mandato e assume o suplente[14], salvo se houver ilicitude(compra de voto, abuso de poder), por força da “teoria do fruto da árvore envenenada”.
Assim, podemos dizer que a situação jurídica de suposto analfabetismo de Tiririca somente o atinge, ou melhor:
“Tiririca, pior que tá, NÃO FICA” ! – ou “fica”[15] ?
Se tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando, falei muitas vezes como um palhaço mas jamais duvidei da seriedade da plateia que sorria.
Charles Chaplin
*** Para conferir com profundidade o tema – sistema proporcional e votos nulos/consequências, conferir nossa obra “Reformas Eleitorais Comentadas”, Editora Saraiva, 2010, comentários ao artigo 16-A da Lei Eleitoral nas páginas 563 a 577.