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Prescrição: aplicação no tempo da Lei n.14.230/21 (que alterou a Lei n. 8.429/92 -Lei de Improbidade Administrativa)

Resumo: Este artigo tem o objetivo de analisar as alterações havidas na Lei n. 8.429/92 no que se refere à prescrição. Para tanto, são expostos os objetivos que inspiraram o projeto, buscando a interpretação da Lei n. 14.230/21 à luz desta motivação. A seguir, apresenta os fundamentos constitucionais do direito fundamental à boa administração pública. Prossegue buscando analisar o direito administrativo sancionador e a natureza difusa do direito à Administração proba. Fixados tais parâmetros, examina o instituto da prescrição, tanto da comum como da intercorrente e a aplicação, no tempo, dos dispositivos que tratam do tema.

Palavras chave. Improbidade Administrativa – Direito fundamental à boa administração pública – Interesse difuso – Prescrição - Aplicação da lei no tempo.

Introdução

A Lei n. 14.230, de 25 de outubro de 2021, decorreu do Projeto n. 10.887/2018, de autoria do Deputado Federal Roberto Lucena, a partir de proposta elaborada pela Comissão de Juristas presidida pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Mauro Campbell Marques.

Este projeto objetivava o aperfeiçoamento da Lei n. 8.429/92 após mais de 20 anos de sua vigência, e incorporava a experiência e a jurisprudência sobre o tema. A propositura preocupou-se, também, em fazer a revisão redacional e a correção de técnica legislativa, fornecendo ao país um diploma que, não obstante alguns pontos que mereciam algum debate, contribuía para o aperfeiçoamento do efetivo combate da improbidade administrativa.

No entanto, este projeto foi desfigurado pelo relatório do Deputado Carlos Zaratini, que apresentou substitutivo acompanhado de razões diversas daquela que inspiraram a Comissão de Juristas.

Este substitutivo, sequer previamente publicado, foi remetido ao Plenário e aprovado em menos de 24 horas.

De igual forma, no Senado Federal o projeto foi aprovado sem maiores discussões e em tempo recorde.

Indo ao Presidente da República, o projeto recebeu sanção integral, não obstante as evidentes inconstitucionalidades e a inegável intenção de afrouxar, injustificadamente, o combate à corrupção.

As profundas alterações feitas pela nova lei vem suscitando intensos debates no seio da comunidade jurídica.

Este artigo objetiva analisar a questão da aplicação, no tempo, dos dispositivos que tratam da prescrição.

1 - Objetivo da Lei n. 14.230/21.

Nas razões do substitutivo apresentado pelo Deputado Carlos Zaratini constou, expressamente:

“O desejo de Justiça que emana da sociedade precisa ser orientado com o respeito às garantias dos acusados. Dessa forma, o sentido da atualização a ser realizada na Lei de Improbidade Administrativa deve ser o de orientar sua aplicação com base em preceitos sólidos de garantia da ampla defesa, contraditório e presunção da inocência, de forma a racionalizar a tutela da moralidade administrativa.

Busca-se, por meio da afirmação de um conceito sólido de improbidade, a criação de um ambiente dotado de previsibilidade e segurança jurídica, conservando a esfera de responsabilidades e encargos dos gestores públicos, hoje ameaçada por um certo sentido inquisitorial dado às ações de improbidade.

Este “certo sentido inquisitorial dado às ações de improbidade” é descoberto do contexto de algumas manifestações havidas quando das audiências públicas e da votação do projeto, constituindo, em síntese, no entendimento de que é feito uso indiscriminado de ações de improbidade administrativa, com imputações do ilícito em casos de simples irregularidades praticadas sem qualquer dolo. Deste quadro teria resultado o denominado “apagão das canetas”, que seria o afastamento da vida pública de pessoas honestas, que temem responder por atos tidos como de improbidade administrativa e receber sanções graves por simples equívocos administrativos ou, ainda, o temor de tomar decisões que, ao final, por comportarem outra visão jurídica, podem levar o agente a ser Réu em tais ações.

Críticas, em um regime democrático, devem ser recebidas e analisadas.

Há que se distinguir o assim chamado uso indiscriminado de ações de improbidade de um certo patrimonialismo do qual, infelizmente, o Brasil ainda não se livrou totalmente. Não se pode negar o dever do agente público de atuar na conformidade com o ordenamento jurídico, agindo com zelo na administração da coisa pública.

Também não cabe negar que algumas ações são improcedentes. Não apenas no âmbito da improbidade administrativa, mas também no penal e no civil. O fato de o Autor imaginar ter razão não significa que o Poder Judiciário assim entenda.

Mas o descabimento de algumas ações de improbidade administrativa não justifica o indevido afrouxamento do combate à corrupção. A uma, simples equívocos ou erros administrativos jamais constituíram ato de improbidade administrativa, como pode ser visto do exame da jurisprudência nacional. A duas, a afirmação de afastamento da vida pública de pessoas honestas que teriam receio de responder por ato de improbidade administrativa carece de qualquer comprovação. A três, o receio de decidir em determinado sentido inabilita o indivíduo para qualquer atividade, inclusive e principalmente a pública.

De toda forma, as pretensões de condenação por ato de improbidade administrativa são submetidas ao Poder Judiciário, que vem desempenhando o seu papel em declarar a improcedência das ações que veiculem pretensões em desconformidade com o ordenamento jurídico.

Constou, também nas razões do substitutivo que as novas alterações objetivavam:

“preservar o objetivo que guia todo o esforço legislativo deste projeto: reformar a Lei de Improbidade Administrativa, de forma a possibilitar o combate à corrupção de forma eficiente, apenando os agentes ímprobos e salvaguardando o pleno exercício da função administrativa pelos gestores públicos honestos”.

É certo que de tal motivação dos legisladores surgiu lei que, em todos os sentidos, afrouxou o combate à improbidade administrativa, varrendo do cenário a jurisprudência já pacificada no Superior Tribunal de Justiça ao longo dos anos de vigência da Lei n. 8.429/92. Como exemplo podem ser citados os julgados reiterados desta Corte, de caráter vinculante, acerca dos requisitos para decretação da improbidadeadministrativa, ou a inclusão da multa civil no valor a ser declarado indisponível.

É inequívoco, também, que a nova lei trouxe para a cena jurídica mecanismos que facilitam livrar os agentes públicos das conseqüências da prática de atos de improbidade administrativa, prevendo, inclusive, prerrogativas aos Réus negadas ao Autor1 e subvertendo, sem outra razão senão beneficiar os imputados, normas processuais aplicáveis a todo direito processo civil2, transformando as ações de improbidade administrativa no instrumento que menos garante a efetividade da jurisdição.

Como mencionado por LAURA MENDES ARMANDO DE BARROS3:

“A recente edição da Lei n. 14.230/21 – por muitos referida como “lei anti-improbidade” – trouxe, para além de inegáveis retrocessos ao sistema de combate à corrupção e promoção da integridade pública brasileiros, uma série de questões de duvidosa constitucionalidade – ou juridicidade”.

O afrouxamento da lei violou o direito fundamental à boa administração pública, que decorre da Constituição Federal, como será, a seguir, abordado.

2 - Lei n. 14.230/21 e violação do direito fundamental à boa administração pública (ou à probidade administrativa).

A Carta da República, em muitas normas, prevê implicitamente o direito à boa administração pública (ou à probidade administrativa), tais como as que estabelecem os princípios atinentes à Administração Pública4, a competência do Poder Legislativo, auxiliado pelos Tribunais de Contas, para fiscalização e controle dos gastos públicos5, o artigo 37, § 4º, da Constituição Federal, que determina a punição por ato de improbidade administrativa, e a previsão, como crime de responsabilidade do Presidente da República, de ato atentatório contra a probidade administrativa.

Este direito fundamental está inserto na Constituição Federal, ainda que não expresso em inciso específico do artigo 5º, encontrando guarida nas normas constitucionais já mencionadas e no § 2º do artigo 5º, da Carta da República, além de fazer parte, desde o Brasil imperial, da história constitucional brasileira.

A Constituição do Império já mencionava a probidade como um dos requisitos para candidatar-se a Membro de Conselhos de Província (art. 75), ao lado de idade mínima e “decente subsistência”. A mesma Constituição afirmava a responsabilidade dos Ministros (art. 133), dentre outros, por peita, suborno ou concussão (inciso II), por abuso de poder (inciso III), pela falta de observância da lei (inciso IV) e por qualquer dissipação dos bens públicos (inciso VI).

A primeira Constituição da República previu o ato atentatório à probidade na administração como crime de responsabilidade do Presidente da República (art. 54, 6º)6. A Constituição de 1934 manteve esta previsão (art. 57), acrescentando apenas a hipótese de descumprimento de decisões judiciais e o atentado ao gozo e exercício dos direitos sociais.

Também foi mantida a hipótese do ato atentatório contra a probidade administrativa como crime de responsabilidade do Presidente da República na Constituição de 1937 (art. 85, d) e na de 1946 (art. 89, V). A Carta de 1967 seguiu no mesmo caminho (art. 84, V), tendo exigido, ainda, a edição de lei complementar estabelecendo outros casos de elegibilidade visando à probidade administrativa (art. 148, II). A denominada Emenda Constituição n. 1, de 17 de outubro de 1969 (que os estudiosos afirmam tratar-se, na verdade, de outra Constituição) manteve-se na mesma trilha (art. 82, V, e 151, II, respectivamente).

A atual Constituição Federal também previu a edição de lei complementar para estabelecer outros casos de inelegibilidade, inclusive para proteger a probidade na administração (art. 14, § 9º). Estabeleceu, também, a vedação da cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará, dentre outros casos, na hipótese de improbidade administrativa (art. 15, V), além de estipular ser crime de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a probidade na administração (art. 85, V).

A existência do direito fundamental à boa administração pública é defendida por JUAREZ FREITAS7:

O Estado Democrático, em sua crescente afirmação (nem sempre linear) da cidadania, tem o compromisso de facilitar e prover o acesso ao direito fundamental à boa administração pública, que pode ser assim compreendido: trata-se do direito fundamental à administração pública eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres,com transparência, sustentabilidade, motivação proporcional, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade por suas condutas omissivas e comissivas. A tal direito corresponde o dever de observar, nas relações administrativas, a cogência da totalidade dos princípios constitucionais e correspondentes prioridades.

Este direito fundamental pode ser extraído, também, do conceito de república (i.é, coisa pública, do povo), e dos objetivos do Estado Brasileiro, assim como de seu dever de concretizar a cidadania e da previsão dos direitos sociais, muitos dos quais demandam prestações que devem ser custeadas pelo Tesouro. Tais prestações são impossíveis se o erário estiver carcomido por atos de corrupção. De outra banda, não se concretiza o direito à igualdade sem a proibição do abuso ou do desvio de poder.

De tudo resulta claro que o direito fundamental à boa administração pública não se positiva sem que exista mecanismo suficiente para o combate à improbidade administrativa.

Sob estas luzes urge analisar a aplicação, no tempo, dos novos dispositivos da Lei n. 14.230/21, que tratam da prescrição.

Alguns defendem que as regras acerca da prescrição retroagem em benefício do Réu, fundando o seu pensamento no fato de que a improbidade administrativa situa-se no âmbito do direito administrativo sancionador, aplicando-se todos os princípios de direito penal, inclusive a norma constitucional de que a lei penal não retroagirá, salvo em benefício do Réu (art. 5º, XL, da Constituição Federal).

3 - Improbidade administrativa: direito administrativo sancionador?

Não há, no Brasil, uniformidade acerca do âmbito de incidência do denominado direito administrativo sancionador.

Este campo do direito vem recebendo, no Brasil, estudos relativamente recentes, sensivelmente incrementados a partir da Constituição Federal de 1988, que previu que nos processos administrativos seja observado o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, LV), estendendo para a esfera administrativa garantia própria do direito processual.

O direito administrativo sancionador encontrou a sua justificativa no papel cada vez maior do Estado e na necessidade de colocar parâmetros na sua atuação sancionadora. Diz respeito à proteção dos direitos individuais quando o Estado, no âmbito administrativo, exerce o poder sancionador. Por outras palavras, estuda o processo administrativo, instrumento indispensável para que a Administração imponha qualquer sanção, sem necessidade de se valer do Poder Judiciário. Aliás, o contraditório e a ampla defesa também constituem exigência quando da atuação da Administração Pública possa resultar a extinção ou modificação de direito do particular.

No entanto, as normas sobre improbidade administrativa não estão na seara do direito administrativo sancionador.

É possível falar que o direito administrativo sancionador constitui um desdobramento do direito administrativo, buscando o estabelecimento de base teórica, princípios e regras para a imposição de sanções pela Administração Pública ou no exercício da função administrativa, de forma que o resultado do apenamento respeite os direitos fundamentais dos imputados e signifique decisão justa.

Assim, inegavelmente o direito administrativo sancionador constitui um sistema que, embora ligado ao direito administrativo, dele se aparta com relação aos seus fundamentos, seus princípios, sua estrutura e objetivo. Basta lembrar que, nas bases teóricas do direito administrativo sancionador não se encontra o princípio da preponderância do interesse público sobre o privado (atualmente sujeito a releituras), próprio do direito administrativo. É o suficiente para reconhecer que não há concordância total do âmbito de incidência de cada um destes sistemas que, ademais, podem incidir sobre um mesmo fato, sob perspectivas diversas e com pressupostos próprios e independentes.

Nesse sentido o entendimento do Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno, ADI 3951/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julg 29.05.20) que, decidindo a possibilidade de imediata apreensão de documento de habilitação para dirigir veículos no caso de excesso de velocidade – decorrente do poder de polícia, matéria afeta ao direito administrativo - decidiu que a providência não abalava o princípio do devido processo legal na imposição da sanção de suspensão do direito de dirigir – matéria de direito administrativo sancionador:

O argumento de violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa, contudo, não deve prevalecer. A leitura do dispositivo em comento, art. 218, III, CTB, deve ser sistemática em relação ao diploma legal como um todo. A melhor interpretação do dispositivo permite concluir que a suspensão do direito de dirigir será aplicada pela autoridade competente de maneira conforme ao procedimento previsto no art. 281 e seguintes do Código de Trânsito Brasileiro, asseguradas as garantias constitucionais inerentes ao devido processo legal.

Ademais, conforme bem ressaltou a d. Procuradoria-Geral da República em parecer colacionado aos autos, a medidas previstas pelo dispositivo impugnado, ou seja, a suspensão imediata do direito de dirigir e a apreensão do documento de habilitação, têm evidente natureza acautelatória, providências administrativas que visam assegurar a eficiência da fiscalização de trânsito em flagrante prática de ato classificado como de gravíssimo risco para a segurança pública. Em que pesem as alegações do requerente, não se trata de aplicação sumária de penas administrativas, portanto. Não verifico, assim, violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Integra esta julgado o voto vencedor do Ministro Alexandre de Moraes:

Ao meu ver, a metodologia empregada pela norma questionada, no que simplesmente posterga o contraditório na hipótese excepcionalíssima que descreve, encontra amparo no dever de proteção à vida da coletividade, para o qual a segurança no trânsito se coloca como uma das questões de maior importância.

(...)

O poder de polícia administrativa é permeado por alguns atributos, dentre os quais se destaca a autoexecutoriedade, a qual, segundo explica MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, permite q imposição, ao Administrado, de “um limite em sua liberdade de atuação” (DIREITO ADMINISTRATIVO, 3ª. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2018, pág. 199).

Logicamente, consoante poderá JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, “a autoexecutoriedade não deve consistir objeto de abuso de poder, de modo que deverá a prerrogativa compatibilizar-se com o princípio do devido processo legal para o fim de ser a Administração obrigada a respeitar as normas legais” (MANUAL DE DIREITO ADMINISTRATIVO, 31ª. Ed, São Paulo: Atlas, 2017, pág. 90).

No caso em apreço, longe de ensejar abuso de poder por parte do Estado, a norma impugnada resulta de uma bem sucedida política pública, tendente a diminuir um grave problema das rodovias brasileiras, concernentes ao extremado excesso de velocidade.

Diante da gravidade da conduta, afigura-se razoável que a atuação preventiva/cautelar do Estado não seja dependente da instauração de um contraditório prévio, na medida em que, além do direito do infrator ao devido processo legal, também coloca-se em jogo a vida e a saúde de toda a coletividade.

Por outras palavras, com relação a um mesmo fato podem incidir o sistema de direito administrativo, em especial o poder de polícia, caracterizado pela autoexecutoriedade, e o sistema de direito administrativo sancionador, fundado em princípios específicos.

Um sistema, em qualquer área do conhecimento, é uma unidade, um conjunto de elementos interdependentes que funcionam coerentemente para atingir determinado objetivo.

Etimologicamente, o sentido da palavra traz a idéia de algo estruturado com vistas a atingir certa finalidade.

Um sistema exige, obrigatoriamente, a fixação de um objetivo claro, sob pena de absoluta inutilidade da construção. Aliás, sem um objetivo, sequer seria possível reunir elementos que supostamente seriam interdependentes e coerentes.

Não é diferente com o sistema jurídico, que consiste no conjunto de normas – princípios e regras – interdependentes e que funcionam para a consecução de determinado objetivo.

Em uma sociedade cada vez mais complexa, o sistema jurídico passou a ser composto por variados subsistemas, cada um deles tendente a atingir determinada finalidade. Assim, pode-se falar em sistema processual civil, sistema processual penal, cada um deles regrando determinado aspecto do Direito. De igual forma, é possível conceber o sistema do direito administrativo e o sistema do direito administrativo sancionador que, não obstante compartilhem alguns fundamentos, tem objetivos próprios e independentes.

O elemento que deve nortear o direito administrativo sancionador é o orgânico, vale dizer, exercido pela Administração Pública.

DIOGO DE FIGUEIREDO MOREIRA NETO8 se refere aos atos administrativos punitivos conceituando-os como os que tem por objeto a aplicação de sanções impostas pela Administração Pública.

JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO9 define sanção administrativa como o ato punitivo que o ordenamento jurídico prevê como resultado de uma infração administrativa, suscetível de ser aplicado por órgãos da Administração.

Destas duas definições percebe-se que o que caracteriza uma sanção como administrativa é o fato de ser aplicada pela Administração.

É certo que, à vista do desenvolvimento dos estudos acerca deste aspecto do direito administrativo, alguns doutrinadores entendem de colocar sob esta égide a improbidade administrativa10.

No entanto, não há fundamentos aceitáveis para este entendimento.

As sanções por improbidade administrativa são aplicadas pelo Poder Judiciário que, para tanto, já conta com arsenal adequado para que os processos se desenvolvam com a garantia do direito dos Réus. Assim, desnecessário que o instituto seja colocado no âmbito do direito administrativo sancionador. Aliás, esta colocação dividiria todo o poder sancionatório estatal em direito penal e direito administrativo sancionador, ignorando a via da improbidade administrativa, com estatura constitucional própria e com a previsão de cominações de ordem variada (tais como o ressarcimento do erário, com natureza civil, a suspensão dos direitos políticos, de ordem constitucional e eleitoral).

A propósito, MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO11 afirma que a improbidade administrativa caracteriza um “ilícito de natureza civil e política, porque pode implicar a suspensão dos direitos políticos, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento dos danos causados ao erário”, acrescentando que “tratando-se de sanções de natureza civil e política, sua aplicação escapa à alçada da Administração Pública”.

Ademais, a divisão do poder punitivo estatal em direito penal e direito administrativo não contemplaria as sanções previstas no Código Eleitoral, o que mostra a incorreção da divisão sugerida.

Por outro lado, os estudos a este respeito objetivam, primordialmente, estender ao direito administrativo as garantias próprias do direito penal, assegurando que na aplicação de sanções sejam respeitados os direitos fundamentais. Não obstante, não há igualdade entre estes ramos do direito.Além disto, a Constituição Federal não permite esta extensão, determinando que a punição dos atos de improbidade administrativa seja feita independentemente da esfera penal (art. 37, § 4º).

Com efeito, a defesa da probidade administrativa foi colocada pela Constituição Federal no âmbito da tutela dos direitos difusos, cuja proteção se dá no campo não-penal. Esta conclusão é extraída do disposto no artigo 129, III:

São funções institucionais do Ministério Público: (...)

III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Evidente que o texto, ao se referir a “outros interesses difusos e coletivos”, conferiu esta mesma natureza aos interesses antes mencionados, quais sejam, o de proteção do patrimônio público e social e do meio ambiente.

Aliás, o Superior Tribunal de Justiça, de forma reiterada, afirma que a ação civil pública de improbidade administrativa compõe o microssistema ou minissistema de proteção dos interesses ou direitos coletivos em sentido amplo12.

A imposição das sanções pela prática de ato de improbidade administrativa não é do Estado-administração, mas do Estado-juiz, que atua no campo civil, por expressa disposição constitucional contida no artigo 37, § 4º:

“Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública e a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento do erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”

JOSÉ ROBERTO PIMENTA OLIVEIRA e DINORÁ ADELAIDE MUSETTI GROTI13, após afirmar que não há consenso, atualmente, sobre o âmbito material do direito administrativo sancionador, entendem que, em face do patamar constitucional do direito punitivo, o estudo sistemático da improbidade administrativa deve ser feita neste âmbito. Registram a gravidade das sanções por tais ilícitos o que, todavia, não as colocam no seio do direito penal e que o fato de serem impostas judicialmente não as atiram ao direito processual civil.Acrescentam:

A análise científica do domínio punitivo da improbidade deve ser realizada pelo Direito Administrativo Sancionador, que passou a congregar todas as sanções imponíveis por ilícitos praticados por agentes públicos, mesmo que decretadas pela jurisdição cível comum, já que não revestidas de caráter penal. Em rigor, é possível defender que o artigo 37, parágrafo 4º, funciona como cláusula de judicialização obrigatória da competência sancionadora, quando o Estado busca punir expressamente ilícitos qualificados como “atos de improbidade administrativa” descritos em lei.

No entanto, este não é o melhor entendimento sobre o tema.

Primeiro, porque a inclusão de sanções aplicadas em sede jurisdicional não é pertinente ao objetivo do sistema que justificou a concepção e o desenvolvimento do direito administrativo sancionador, qual seja, o de estudar as sanções impostas no âmbito administrativo e construir arcabouço teórico para que, nesta órbita, fossem respeitados os direitos fundamentais dos imputados.

A inclusão de sanções por improbidade administrativa no âmbito do direito administrativo sancionador avança sobre outros ramos do Direito, alterando os sistemas respectivos sem utilidade qualquer para o ordenamento jurídico, uma vez que é sabido que o sistema processual civil prevê garantias próprias às partes.

Segundo, porque o fato de que a improbidade administrativa estar apartada do direito penal – e isto por cláusula constitucional – não a joga, automaticamente, no seio do direito administrativo sancionador. Esta concepção parte do entendimento de que apenas estes dois ramos do Direito podem ser considerados.

Embora o poder punitivo seja único, ele se desdobra em várias esferas e, por vezes, incide em todas elas. Basta lembrar, a este propósito, as normas de direito ambiental e de direito sanitário, que prevêem sanções administrativas, civis e penais. Fosse único o poder punitivo, o ordenamento deveria escolher a seara das sanções respectivas, jogando por terra o postulado da independência das instâncias e conferindo proteção deficiente a bens jurídicos caros à sociedade.

Sobre a independência das instâncias, o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a concomitância de esferas diversas no que respeita à responsabilidade por ato de probidade administrativa. Como exemplo:

A norma constitucional prevista no § 4º do art. 37 exigiu tratamentos sancionatórios diferenciados entre os atos ilícitos em geral (civis, penais e político-administrativos) e os atos de improbidade administrativa, com determinação expressa ao Congresso Nacional para edição de lei específica (Lei 8.429/1992), que não punisse a mera ilegalidade, mas sim a conduta ilegal ou imoral do agente publico voltada para a corrupção, e a todo aquele que o auxilie, no intuito de prevenir a corrosão da máquina burocrática do Estado e de evitar o perigo de uma administração corrupta caracterizada pelo descrédito e pela ineficiência.

A Constituição Federal inovou no campo civil para punir mais severamente o agente público corrupto, que se utiliza do cargo ou de funções públicas para enriquecer ou causar prejuízo ao erário, desrespeitando a legalidade e a moralidade administrativas, independentemente das já existentes responsabilidades penal e político administrativa de Prefeitos e Vereadores.

(Tribunal Pleno, Rextr 976.566-Pará, REl. Min. Alexandre de Moraes, julg. 13.09.2019)

Por fim, o artigo 37, § 4º da Constituição Federal ocupa posição central no combate à improbidade administrativa, devendo merecer interpretações à vista da máxima efetividade do direito fundamental à probidade administrativa.

Em síntese, o alargamento do âmbito de incidência do denominado direito administrativo sancionador conspira contra o seu próprio objetivo, quebrando não apenas o seu sistema como outros sistemas que, juntamente com ele, formam o ordenamento jurídico.

Ademais, desconsidera que a improbidade administrativa está situada no âmbito dos interesses difusos e coletivos, como adiante será exposto.

4 - Direito fundamental à probidade administrativa: direito difuso

A proteção da probidade administrativa foi inserida, pelo Constituinte, na órbita dos direitos difusos (129, III, da Carta da República), com expressa determinação de seu apartamento do direito penal (art. 37, § 4º, da Carta da República).

O direito fundamental à probidade administrativa constitui, inegavelmente, interesse difuso, na conceituação dada pelo Código de Defesa do Consumidor: “os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato (art. 81, parágrafo único, I). Na lição de DANIEL AMORM ASSUMPÇÃO NEVES14,

Na realidade, os titulares não são sujeitos indeterminados, mas sim a coletividade. Esta coletividade, naturalmente, é formada por pessoas humanas, mas o direito difuso não as considera como indivíduos, mas tão somente como sujeitos que compões a coletividade, como integrantes desta”.

Assim, quer se entenda que os interesses difusos são titularizados por pessoas indeterminadas, ou pela coletividade – composta por estas pessoas indeterminadas - o certo é que estão presentes todos os elementos caracterizadores do interesse difuso na proteção da probidade administrativa.

Neste sentido, a Lei n. 7.347/85 expressamente prevê o cabimento da ação civil pública para proteção do patrimônio público e social (art. 1º, VIII).

Tão relevante este direito que, a par da sua proteção pelo direito penal e pelo direito administrativo, foi instituída a tutela no âmbito do interesses difusos. Esta solução não constitui qualquer novidade, uma vez que o mesmo se dá quanto a tantos outros direitos difusos, tais como o consumidor e o meio ambiente.

A natureza difusa do direito à moralidade administrativa é afirmada, há muito, por WALLACE PAIVA MARTINS JÚNIOR15:

Por dimensão estrutural, a moralidade administrativa é um valor socialmente difundido e, por isso, pertencente a toda a coletividade, indivisível e indeterminadamente, integrando o patrimônio social, como pondera Lúcia Valle Figueiredo, garantindo o direito subjetivo público a uma Administração Pública honesta, pois, na medida em que se estabelece e se desenvolve, impõe limites e apresenta redutores à discricionariedade administrativa, ao desvio de poder, à desonestidade, à deslealdade, implantando uma rede de proteção ética destinada à sublimação das regras da boa administração.

No mesmo sentido o entendimento de EMERSON GARCIA E ROGÉRIO PACHECO ALVES16 que, após deduzirem, do art. 129, III, da Constituição Federal, a natureza difusa da tutela do patrimônio público, afirmam: “Mesmo à falta de tão esclarecedora regra, não seria difícil perceber que a tutela do patrimônio público, interesse jurídico titularizado por toda a sociedade, se insere na órbita dos direitos difusos.”

A natureza difusa do direito ora discutido vem sendo, há muito e em inúmeros julgados, reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça17

Neste passo, deve ser lembrado que em 1º de agosto de 2013 foi editada a Lei n. 12.846, de 11 de agosto de 2013, inspirada por convenções internacionais18. A proposta desta lei foi acompanhada de razões na qual consta que o Brasil obrigou-se a punir de forma efetiva as pessoas jurídicas que praticam atos de corrupção, em especial o denominado suborno transnacional, caracterizado pela corrupção ativa de funcionários públicos estrangeiros e de organizações internacionais.

Ainda, da mensagem do Poder Executivo consta que a responsabilidade por ato de corrupção já era previsto na lei penal a qual, todavia, “não oferece mecanismos efetivos ou céleres pára punir as sociedades empresárias, muitas vezes as reais interessadas ou beneficiadas pelos atos de corrupção”, daí porque a responsabilização civil era indispensável. Lembrou-se, ainda, que a Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992 ainda não oferecia proteção suficiente, consignando-se o seguinte texto:

“Todavia, em sua disciplina, a responsabilização de pessoa jurídica a depende da comprovação de ato de improbidade do agente público, e as condutas previstas pela lei são de responsabilidade subjetiva, devendo ser comprovada a culpa dos envolvidos, com todos os inconvenientes que esta comprovação gera com relação às pessoas jurídicas”.

Esta referência é feita para demonstrar que, no atingimento de seus objetivos e considerando a pluralidade das instâncias, pode o legislador estipular esferas variadas de responsabilidade, o que retira da premissa de que o poder estatal é uno a consequência de que em todas as esferas de responsabilidade devem incidir os mesmos princípios. Não se quer, com isto, defender que existe alguma instância na qual os direitos fundamentais não devem ser respeitados, mas, sim, de que as garantias dos indivíduos ganham colorido específico em cada uma delas.

Na Lei n. 12.846/13 consta a possibilidade de aplicação de sanções pela autoridade administrativa e pela autoridade judicial. Com relação à primeira, a lei previu os passos do processo administrativo (art. 8º a 15).Na esfera judicial previu-se que deve ser adotado o rito previsto na Lei n. 7.347/85 (art. 20), o que reafirma a natureza de direito difuso ao combate à corrupção.

Conclusão é que os dispositivos do direito administrativo sancionador são aplicáveis aos casos em que são ou podem ser aplicadas sanções administrativas, assim entendidas como as que são impostas pela Administração.

De toda forma, ainda que se entendesse que a improbidade administrativa situa-se no direito administrativo sancionador, não necessariamente se aplicaria, a ela, de forma automática, todos os princípios e garantias próprias do direito penal. Isto porque é inegável que o direito penal incide com muito maior intensidade na defesa dos bens jurídicos que pretende preservar - por importantes à vida social- relativamente ao direito administrativo sancionador. Constitui prerrogativa do legislador definir determinada conduta com crime, caso entenda que há necessidade de maior repressão à infração, ou como infração administrativa, se assim não entender.

Não altera esta afirmação o fato de que algumas sanções do direito administrativo sancionador podem se mostrar mais gravosas que as previstas na órbita penal. As sanções são impostas à vista da gravidade do ilícito.

A não aplicação automática dos direitos próprios do direito penal já foi reconhecia pelo Supremo Tribunal Federal, ao editar a Súmula Vinculante n. 05, que entende desnecessário, no âmbito do processo administrativo disciplinar, a defesa técnica: “A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”.

Com efeito, a defesa técnica constitui exigência incontornável no direito processual penal, sendo nulo o processo se não for nomeado defensor ao réu que não o tiver (art. 564 do Código de Processo Penal).

A defesa técnica, no processo penal, é exigência que se manifesta, ainda, no enunciado da Súmula 705 do Supremo Tribunal Federal, que determina o conhecimento de apelação do defensor se o réu, ao renunciar ao recurso, não contou com a assistência de advogado. E pela Súmula 708 da mesma Corte, que declara ser nulo o julgamento da apelação se, após a renúncia do único defensor, o réu não foi intimado a constituir outro.

Não sendo o caso de extensão automática, ao direito administrativo sancionador, de todos os princípios e garantias do direito penal, cumpre pesquisar quais deles são aplicáveis.

BENEDITO GONÇALVES E RENATO CÉSAR GUEDES GRILO 19 ao tratar dos princípios do direito administrativo sancionador aplicáveis em matéria de improbidade administrativa, mencionam a legalidade formal (ou tipicidade), a legalidade material (ou lesividade), a antijuridicidade e a culpabilidade.

A estes princípios devem ser acrescentados os demais, atinentes ao processo administrativo, quais sejam, os expressamente previstos no art. 37, “caput”, da Constituição Federal, o da motivação, da razoabilidade e da proporcionalidade e o da segurança jurídica.

Todos estes princípios estão previstos na Constituição Federal, que não os limitou, expressamente, ao direito penal, como aconteceu com o da retroatividade da lei penal mais benéfica.

Registre-se que a Lei n. 14.230/21 acrescentou ao art.1º da Lei 8.429/92 o § 4º: “Aplicam-se ao sistema de improbidade disciplinado nesta lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador”.

Ora, partindo da premissa magistralmente exposta por CARLOS MAXIMILIANO de que a lei não contém palavras inúteis20, devendo todas elas ser entendidas “como escritas adrede para influir no sentido da frase respectiva”21 resulta claro que se a improbidade administrativa estivesse no âmbito do direito administrativo sancionador, seria inútil o dispositivo porquanto evidentemente a ela se aplicariam os princípios que lhe são próprios.

Então, da interpretação do art. 1º § 4º da Lei 8.429/92, na redação dada pela Lei n. 14.230/21 resulta a afirmação da lei de que a improbidade administrativa não está inserida no direito administrativo sancionador.

Fixadas estas premissas, cumpre analisar a aplicação no tempo das novas disposições acerta da prescrição.

- Prescrição: Conceito

WASHINTON DE BARROS MONTEIRO e ANA CRISTINA DA BARRROS MONTEIRO FRANÇA PINTO22 trazem notícia histórica acerca da prescrição, indicando que a gênese deste termo vem da palavra praescriptio, que significa um escrito posto antes. Ressaltam que o direito canônico mostrou-se hostil ao instituto por ver nele uma exceção imoral, ao liberar o devedor de sua obrigação: “Mas o certo é que ela figura indiscriminadamente em todas as legislações contemporâneas pro Bono publico, havido como filha do tempo da paz”. A seguir, citando CLÓVIS BEVILAQUA, definem prescrição como “a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em conseqüência do não- uso desta, durante determinado espaço de tempo”. Assim, segundo estes civilistas, a prescrição exige os elementos tempo e inércia do titular.

Atento a estes requisitos, o Código Civil contêm disposições que afastam a prescrição, quer determinando que ela não corre com relação a pessoas que, por sua própria condição ou pelas circunstâncias em que se encontram, não tem condições de agir - e por consequência, não podem ser consideradas omissas (artigos 197 a 198) -, quer estabelecendo marcos interruptivos do prazo prescricional, que indicam que o titular do direito não ficou inerte (art. 202).

Segundo NESTOR DUARTE23, para que se configure a prescrição são necessários:

a) a existência de um direito exercitável; b) a violação deste direito (actio nata; c) a ciência da violação do direito; d) a inércia do titular do direito; e) o decurso do prazo previsto em lei; e f) a ausência de causa interruptiva, impeditiva ou suspensiva do prazo.

A prescrição é a perda do direito de ação em razão da inércia do titular do direito por determinado prazo.

O seu fundamento é o princípio geral da segurança jurídica, de estatura constitucional, segundo aponta o Supremo Tribunal Federal (MS 32.201, 1ª. Turma, Rel. Min. LUÍS ROBERTO BARROSO, julg. 21.03.2017).

Assim, violado o direito nasce para o titular o direito de propor ação para restabelecimento da ordem jurídica. Nesse sentido, a prescrição pode ser concebida como integrante do próprio direito material, caracterizando- se quando ocorra a violação e seja constatada a inércia do titular

Segundo lição do Ministro ALEXANDRE DE MORAES24:

A prescrição é, como se sabe, o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela inércia do próprio Estado. A prescrição prende-se à noção de perda do direito de punir do Estado por sua negligencia, ineficiência ou incompetência em determinado lapso de tempo. Pune-se a sua inércia, a sua omissão, o seu “non facere”, como bem ressaltado por ANTÔNIO LUÍS DA CÂMARA LEAL:

10. Posto que muitos escritores, como Beviláqua, neguem que a prescrição constitua um castigo à negligência do titular, outros, como João Mendes Júnior, secundando a lição de Savigny, aliás fundada nas formas romanas, o afirmam.

Estamos com o grande romanista tedesco e o saudoso mestre da Faculdade de Direito de São Paulo.

Se a prescrição priva o titular de sua ação, fazendo-o sofrer a perda de um direito, impõe-lhe, de fato, um mal. E, se essa imposição é motivada pela sua inércia, de que resulta um mal social, pelo estado antijurídico que não foi removido pela ação, representando essa inércia a falta de cumprimento de um dever social, não se poderá negar que o mal imposto pela prescrição é, efetivamente, uma repressão do mal causado pela negligência do titular.

E, assim encarada, a prescrição apresenta o característico de pena, cuja clássica definição é: poena est malum passionis propter malum actionis. (Da Prescrição e da Decadência, 4ª. Ed., Forense, 1982, p. 16-17)

Sendo a prescrição, verdadeiramente, uma perda ou, em sentido lato, uma pena, só pode ser reconhecida quando, nascido o direito de ação, o seu titular tem perfeito conhecimento do prazo no qual deverá agir. Não se pode conceber uma pena ou um mal a infligir a quem não era determinado o dever social de agir em determinado prazo. 

A Lei n. 8.429/92, em seu artigo 23, disciplinava a prescrição fixando-a em 5 (cinco)anos após o término do cargo ou emprego em comissão, e para os ocupantes de cargo ou emprego efetivo, no mesmo prazo estabelecido nos respectivos estatutos para a aplicação da sanção de demissão a bem do serviço público.

A Lei n. 14.230/21 alterou esta disciplina, fixando o prazo prescricional em 8 (oito) anos a contar da data do fato25.

O artigo 23, § 1º, traz hipóteses de suspensão do prazo prescricional e o § 4º trata de seus marcos interruptivos. O § 5º determina que, interrompida a prescrição, o prazo recomeça a correr do dia da interrupção, pela metade do período previsto no caput, isto é, por 4 (quatro) anos. Finalmente, a Lei n. 14.230/21 previu a chamada prescrição intercorrente (§ 8º).

A questão que se coloca é se estes novos prazos aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados antes de sua vigência, quer esteja em curso ação, quer esta não tenha sido, ainda, proposta.

- Prescrição:   instituto   de   direito   material   e   Lei   n. 14.230/21.

A resposta à questão colocada acima é negativa.

A prescrição, assim como a decadência, é instituto de direito material, tratada pelo Código Civil, acarretando a resolução do processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 487, II, do Código de Processo Civil, não podendo ser reconhecida sem que antes seja dada às partes oportunidade para manifestar-se (art. 487, parágrafo único, do Estatuto Adjetivo). Não obstante esta consequência de caráter processual, a matéria é estudada no âmbito do direito civil, como registra DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES ao tratar destes temas:

São de direito material os fenômenos jurídicos tratados no parágrafo único do art. 487 do CPC, sendo tanto a prescrição quanto a decadência tratadas no Código Civil. Referem-se a limitações temporais para a argüição perante o Poder Judiciário de tutela de um direito material, com o objetivo de resguardar a segurança de situações jurídicas já estabelecidas. Considerações mais aprofundadas dos institutos jurídicos ora tratados ensejam necessariamente análises de direito material, o que não se encaixa nos imites do presente livro26.

Sendo a prescrição instituto de direito material, a aplicação das leis que disponham a este respeito é regida pela Lei de Introdução às Normas Brasileiras, mais especificamente, o art. 6º: “A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.

Segundo WASHINTON DE BARROS MONTEIRO E ANA CRISTINA DE BARROS MONTEIRO FRANÇA PINTO27:

Em regra, deve prevalecer o princípio da irretroatividade: as leis não tem efeitos pretéritos (Lex prospicit, nos respicit). O princípio da não-retroprojeção constitui um dos postulados que dominam toda a legislação contemporânea. Na frase de GRENIER, esse princípio é a própria moral da legislação.

Prosseguem os Autores:

Efetivamente, sem o princípio da irretroatividade, inexistiria qualquer segurança nas transações, a liberdade civil seria um mito, a estabilidade patrimonial desapareceria e a solidez dos negócios estaria sacrificada, para dar lugar a ambiente de apreensões e incertezas, impregnado de intranqüilidade e altamente nocivo aos superiores interesses do indivíduo e da sociedade. Seria negação do próprio direito, cuja específica função, no dizer de RUGGIERO MAROI, é tutela e garantia28.

Mais adiante:

Saliente-se, todavia, que a retroatividade é exceção e não sepresume. Deve decorrer de determinação legal, expressa einequívoca, embora não se requeiram palavras sacramentais. Nãohá retroatividade virtual ou inata, nem leis retroativas pela suaprópria índole.29

A Lei n. 14.230/21 não trouxe qualquer regra de transição, afastando-se, neste ponto do Código Civil, que em seu artigo 2.028 estabeleceu que os prazos prescricionais são os do Código anterior se (1) forem reduzidos pelo novo Código e (2) se já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Afastou-se, também, do disposto na Lei n. 9.873, de 23 de novembro de 1999, cujo objeto é o estabelecimento de prescrição para o exercício da ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia. Esta lei, ao fixar o prazo prescricional em cinco anos, em seu artigo 4º estabeleceu - ressalvadas as hipóteses de interrupção - para as infrações ocorridas há mais de três anos, contados a partir de 1º de julho de 1988 - o prazo prescricional de dois anos a partir da data da lei.

O projeto de lei apresentado pelo Deputado Roberto Lucena expressamente previa, em seu artigo 23-C, que o novo prazo prescricional (dez anos, contados da data do fato, segundo a redação dada ao caput do art. 23) aplicava-se apenas aos fatos ocorridos após a sua vigência.

A Lei n. 14.230/21 não previu qualquer norma de transição, restando aplicar, no tempo, as disposições acerca da prescrição pela regra geral, vale dizer, “tempus regit actum”. Isto significa que se o ato de improbidade administrativa foi praticado antes da entrada em vigor da nova lei, são aplicáveis os dispositivos anteriores com relação à prescrição. Se praticado após, incidem as novas regras.

A aplicação da norma nova apenas a fatos ocorridos após a sua vigência constitui imperativo de segurança jurídica.

O Supremo Tribunal Federal já acolheu a tese da não retroatividade de norma que dispõe sobre prescrição30. Tratou-se de decidir se a nova regra de prescrição quanto aos trabalhadores rurais, introduzida pela Emenda Constitucional n. 28/2000, que modificou a redação do art. 8º, XXIX, da Constituição Federal e unificou o prazo prescricional de créditos trabalhistas de trabalhadores urbanos e rurais tinha efeito retroativo.

A Corte adotou o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, expresso na Orientação Jurisprudencial n. 27131, concluindo:

Bem se vê,portanto, que a eficácia imediata atribuída pelo art. 3º da EC 28/2000 não implica retroatividade, conforme indica a jurisprudência já consolidada no TST e neste SUPREMO Tribunal Federal, segundo a qual a fluência do prazo prescricional sobre pretensão a crédito trabalhista devido a trabalhador rural somente se inicia a partir da promulgação da promulgação da EC 28/2000.

Nesse sentido: (a) o prazo prescricional da pretensão do trabalhador rural, cujo contrato já era findo quando do advento da EC 28/2000, permanece sob o manto normativo da antiga redação do art. 7º, XXIX, da CF; (b) o prazo prescricional da preensão do trabalhador rural, cujo contrato se encontrava vigente quando do advento da C 28/2000, não se submete ao novo regramento por essa fixado, quanto às pretensões surgidas sob a égide da redação originária do art. 7º, XXIX, da CF.

Esta lição é, em tudo, aplicável em matéria de prescrição das ações de improbidade administrativa.

Inaplicável, como já afirmado, o art. 5º, XL, da Constituição Federal: “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.

Esta   norma   é   aplicável   apenas   à   lei   penal,   como   consta expressamente de seu texto.

O Supremo Tribunal Federal já decidiu neste sentido32.

Por igualdade de razões cabe afirmar que a retroatividade da norma mais benéfica em favor do réu é um princípio exclusivo do Direito Penal, onde está em jogo a liberdade da pessoa, admitindo, até mesmo, o ajuizamento de revisão criminal após o trânsito em julgado da sentença condenatória, a qualquer tempo.

Não se há que admitir interpretação no sentido de que, estando a improbidade administrativa situada no âmbito do direito administrativo sancionador, atrairia as normas todas as normas protetivas da liberdade do direito penal.

Primeiro porque,como já exposto, a improbidade administrativa não se inclui na seara do direito administrativo sancionador.Segundo porque, ainda que estivesse, a norma constitucional não incidiria nesta seara.

Com efeito, o Constituinte já tinha ciência deste ramo do Direito e a ele não escapou a necessidade de estabelecer garantias no âmbito administrativo, tanto assim que determinou que nos processos administrativos fossem observados os princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, § 2º ). Se determinou a retroatividade benéfica ao Réu quanto à lei penal – podendo, como é claro, ter determinado esta retroatividade ao direito administrativo sancionador ou a qualquer outro ramo– é porque pretendeu, efetivamente, que esta garantia estivesse restrita no âmbito das leis penais.

- Prescrição intercorrente.

A natureza jurídica da prescrição intercorrente é a mesma da prescrição, ou seja, é de direito material. Na realidade, a intercorrente constitui apenas uma espécie de prescrição, classificada segundo o momento em que pode ser consumada. Assim, a prescrição poderia ser classificada em comum ou intercorrente, segundo o momento em que se positive: antes ou depois do ajuizamento da ação.

A natureza jurídica de direito material da prescrição intercorrente é reafirmada por recente alteração legislativa no Código Civil, cujo artigo 206-A dispõe: “A prescrição intercorrente observará o mesmo prazo de prescrição da pretensão” (Lei n. 14.195, de 26 de agosto de 2021).

Claro que sendo uma espécie de prescrição, compartilha de seus elementos, vale dizer, (1) a perda do direito de ação (2) em razão de seu não exercício (3) por determinado período fixado em lei.

Em sede ação de improbidade administrativa, o Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência pacífica no sentido de não se configurar a prescrição intercorrente:

O STJ firmou entendimento de inaplicabilidade da prescrição intercorrente às ações de improbidade administrativa, na medida em que o art. 23 da LIA refere-se apenas à prescrição qüinqüenal para a propositura da ação contados do término do exercício do mandato, cargo em comissão ou função de confiança. Nesse sentido: REsp 1.721.025/SE, REl. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2/8/2018; AgInt no AREsp 962.059/PI, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 29/5/2017; EDcl no AREsp 156.071/ES, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembargador Convocado no TRF da 1ª. Região), Primeira Turma, DJe 25/2/2016.

(Primeira Turma, AgInt no REsp 1872310/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julg. 05.10.2021)

O projeto elaborado pela Comissão de Juristas e apresentado à Câmara Federal pelo Deputado Roberto Lucena não previu a possibilidade de prescrição intercorrente.

No entanto, a Lei n. 14.230/21, na redação dada pelo substitutivo, assim dispôs sobre o assunto, no art. 23, § 8º:

§ 8º O juiz ou o tribunal, depois de ouvido o Ministério Público, deverá, de ofício ou a requerimento da parte interessada, reconhecer a prescrição intercorrente da pretensão sancionadora e decretá-la de imediato, caso, entre os marcos interruptivos referidos no § 4º, transcorra o prazo previsto no § 5º deste artigo.

A primeira observação que cumpre fazer é a de que não se pode falar em prescrição onde não há inércia do Autor, ou seja, onde não há conduta omissiva imputável a ele. É o que dispõe, expressamente, o art. 240, § 3º, do Código de Processo Civil: “A parte não será prejudicada pela demora imputável exclusivamente ao Poder Judiciário”.

Na mesma linha a Súmula 106 do Superior Tribunal de Justiça: “Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da argüição de prescrição ou de decadência”. Inúmeros julgados são neste sentido, valendo mencionar, por esclarecedor, o seguinte:

Ademais, é firme o entendimento do STJ no sentido de que somente a inércia injustificada do credor caracteriza a prescrição intercorrente na execução, o que não se verifica no caso concreto, já que a demora no andamento do feito se deu por motivos inerentes ao próprio mecanismo judiciário

(4ª. Turma AgInt no AREsp 1169279/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julg. 17.05.2018)

A segunda observação é de que a prescrição intercorrente só deve reconhecida nos processos que tenham por objeto atos ilícitos praticados após a vigência da Lei n. 8.429/92.

Nesse sentido, acolhe-se, por identidade de fundamentos, a posição do Superior Tribunal de Justiça, decidindo sobre a impossibilidade de reconhecimento da prescrição intercorrente a infrações de trânsito ocorridas antes da vigência da norma que possibilitaria a extinção do direito da Administração:

Em que pese ao lapso temporal entre a conclusão do procedimento de apuração administrativo (15/7/2014) e a notificação da decisão final (20/3/2018) ter transcorrido mais de 3 anos, côo já dito pelo Tribunal de origem, a norma específica que albergaria o direito do impetrante, citada na petição inicial do mandamus (art. 24, III, e § 5º, ambos da Resolução n. 723/2018 do CONTRAN)e reproduzida na petição de apelação, possui vigência a partir de 1º de novembro de 2016 (em sua redação original, segundo o Tribunal), inaplicável ao ato cometido em 1º de janeiro de 2014.

(2ª. Turma, AgInt no AREsp 1825041/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, julg. 04.10.2021)

De fato, a contagem de prazo prescricional antes da modificação legislativa, além de não ter suporte teórico, ofende o princípio da segurança jurídica.

Relembre-se que o instituto da prescrição está ligado à inércia do titular do direito por certo prazo. Não se pode extinguir ação de legitimado que não restou inerte e que, ademais, desconhecia o prazo de atuação.

O seguinte exemplo ilustrará o absurdo da contagem retroativa do prazo prescricional. Imagine-se um órgão do Ministério Público com a atribuição de tomar providências em dois casos distintos. No primeiro, aprescrição está próxima, razão pela qual é priorizado. No segundo, o prazo prescricional sequer teve início, e validamente, não recebe a atenção prioritária. Vindo  a alteração legislativa, percebe-se que a sua aplicação retroativa implicaria prescrição deste segundo caso. É adequado este reconhecimento? A resposta é negativa, não só por imperativo de justiça – o que já seria suficiente – mas porque o titular do direito só pode, validamente, ter contra si a declaração de prescrição se conhece, de antemão, o seu termo inicial e o seu prazo. Sem o conhecimento de tais elementos, não é possível falar em inércia.

Diante destas considerações, os dispositivos acerca a prescrição previstos na Lei n. 14.230/21 só devem ser aplicados a fatos ocorridos após a sua vigência.

CONCLUSÕES

O direito fundamental à boa administração pública, ou o direito à probidade administrativa está previsto na Constituição Federal.

O direito administrativo sancionador constitui sistema próprio com o objetivo de estabelecer os fundamentos e requisitos para que a Administração Pública imponha alguma sanção administrativa.

A improbidade administrativa não está situada no âmbito do direito administrativo sancionador.

A defesa da probidade administrativa está compreendida na seara dos direitos difusos, esfera que convive com as demais – administrativa e penal - para mais adequada proteção do direito fundamental à boa administração pública.

Ainda que a improbidade administrativa estivesse no seio do direito administrativo sancionador, não se aplicariam, automaticamente, todos os princípios do direito penal, ainda mais considerando que não há coincidência entre estes ramos do Direito.

Não se aplica, no âmbito da improbidade administrativa, o princípio da retroatividade da norma mais favorável ao Réu, por ser este princípio, por determinação constitucional, específico do direito penal.

A prescrição tem natureza jurídica de direito material e as normas que disponham sobre ela não tem aplicação a fatos anteriores.

A prescrição intercorrente tem natureza jurídica de direito material e quanto a ela, igualmente, as normas que sobre ela disponham não se aplicam a fatos anteriores à sua vigência.

NOTAS

1 De que é exemplo o art. 10-F, inciso II, que comina nulidade para a decisão que condenar o requerido sem a produção das provas por ele tempestivamente especificadas, não conferindo este mesmo direito – aliás, despropositado, uma vez que não considera o requerimento de produção de provas inúteis ou desnecessárias – ao Autor.

2 Como exemplo, cite-se o artigo 17, § 18, incluído pela Lei n. 14.230/21, que estabelece ser direito do réu ser interrogado, e que a sua recusa ou silêncio não implica confissão, com alteração do sistema processual civil que estabelece que cabe a uma parte o direito de requerer o depoimento pessoal da outra e que o silêncio ou recusa implica confissão. Ou o art. 18, § 4º, que permite o parcelamento do débito resultante de condenação em até 48 (quarenta e oito meses), bastando a demonstração do devedor de sua incapacidade financeira, alterando substancialmente a moratória legal prevista no art. 916 do Código de Processo Civil, que permite o parcelamento ate 6 (seis) vezes, desde que deposite 30% (trinta por dento) do valor do débito. Ou que altera a ordem de constrição no caso de decretação de indisponibilidade de bens, colocando o dinheiro em último lugar, atentando gravemente contra o princípio da efetividade da jurisdição (art. 16, § 11).

3 “A gritante antijuridicidade contida na nova Lei de Improbidade Administrativa”, in Consultor Jurídico, edição de 11 de novembro de 2021.

4 Art. 37. “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte”, seguindo inúmeras disposições acerca da gestão da coisa pública, em detalhamento que mostra a preocupação com a boa gestão da coisa pública.

5 Art. 70 a 75 da Constituição Federal.

6 Art. 54 – São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra: 1º) a existência política da União; 2º) a Constituição e a forma do Governo federal; 3º) o livre exercício dos Poderes políticos; 4º) o gozo, e exercício legal dos direitos políticos ou individuais; 5º) a segurança interna do Pais; 6º) a probidade da administração; 7º) a guarda e emprego constitucional dos dinheiros públicos; 8º) as leis orçamentárias votadas pelo Congresso.

7 Direito Fundamental da Boa Administração Pública. 3ª. Ed, refundida e aumentada. São Paulo: Malheiros. 2014. pág. 21

8 Curso de Direito Administrativo. 16ª. Ed, rev. e atual. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2014, pág. 177

9 Manual de Direito Administrativo. 25. Ed. rev., ampl e atual até a Lei n. 12.857, de 3-1- 2012. São Paulo: Atlas, 2012, pág. 91.

8 Curso de Direito Administrativo. 16ª. Ed, rev. e atual. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2014, pág. 177

9 Manual de Direito Administrativo. 25. Ed. rev., ampl e atual até a Lei n. 12.857, de 3-1- 2012. São Paulo: Atlas, 2012, pág. 91.

12 De que é exemplo, dentre inúmeros outros, recente julgado da Segunda Turma (REsp 1.925.492-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julg. 4.5.2021), ao proclamar que o artigo

19 da Lei da Ação Popular, que igualmente integra o microssistema e que prevê o cabimento de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias, prevalece relativamente ao artigo 1015 do Código de Processo Civil, que enumera taxativamente as hipóteses de cabimento de tal recurso e que só se aplica subsidiariamente.

13 “Direito administrativo sancionador brasileiro: breve evolução, identidade, abrangência e funcionalidade”, in Interesse Público, Belo Horizonte, ano 22, n. 120, p. 83/126, mar./abr. 2020.

14 Ações Constitucionais. 3ª. Ed. rev, atual e ampl. Salvador: Editora Juspodivm, 2017, pág. 397.

15 Probidade Administrativa. São Paulo:Saraiva. 2000, pág. 90.

16 Improbidade Administrativa. 9ª. Ed. São Paulo: Saraiva. 2017, pág. 817.

17 Suficiente, neste ponto, lembrar o julgado de 15.10.2009 (1ª. Turma, REsp 1085218/RS, Rel. Min. Luiz Fux), que expressamente declara: “A probidade administrativa é consectário da moralidade administrativa, anseio popular e, a fortiori, difuso”.

18 Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (ONU), Convenção Interamericana Contra (de Combate à)  a  Corrupção, da Organização dos Estados Americanos e a Convenção sobre Combate À Corrupção de Funcionários Estrangeiros em transações comerciais internacionais, editada pela Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico.

19 “Os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador no Regime Democrático da Constituição de 1988”, in Revista de Estudos Constitucionais, v. 7, n. 2, p. 467-478, mai/ago. 2021.

20 Hermenêutica e Aplicação do Direito. 18ª. Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2000, pág. 110.

21 O Autor ensina, ainda, que não se pode presumir antinomias ou incompatibilidades na lei: “Supõe-se que o legislador, e também o escritor do Direito, exprimiram o seu pensamento com o necessário método, cautela, segurança; de sorte que haja unidade de pensamento, coerência de ideias; todas as expressões de combinem e harmonizem. Militam as probabilidades lógicas no sentido de não existirem,sobre o mesmo objeto, disposições contraditórias ou entre si incompatíveis, em repositório, lei, tratado, ou sistema jurídico.

22 Curso de Direito Civil – Parte Geral. 42ª. Ed. São Paulo: Saraiva. 2009, pág. 352/353.

23 Código Civil Comentado – Doutrina e Jurisprudência. Coordenador Ministro Cezar Peluso. 4ª. Ed. rev. e atual. Barueri-SP: Manole, 2010, pág. 144.

24 Tribunal Pleno, Emb. Div. No Ag. Reg. no Recurso Extraordinário n. 1.181.372-SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julg. 19.04.21. O julgado foi proferido sobre matéria criminal, mas trouxe importantíssimo conceito de prescrição em todo o sistema jurídico.

25 TIAGO DE CARMO MARTINS (“A prescrição na nova Lei de Improbidade Administrativa”, in Consultor Jurídico, edição de 3 de novembro de 2021) aponta que “Além de teoricamente inapropriada, a fixação de prazo de prescrição de oito anos, com início da fluência na data do fato ilícito, destoa de estatutos que também miram o fenômeno da corrupção. Basta notar que o recebimento de propina, sancionado pelo Direito Penal e pelo Estatuto dos Servidores Públicos Federais (Lei 8.112/90), está sujeito a prazo prescricional de 16 anos, que se inicia, no caso desta última norma, “da data em que o fato se tornou conhecido” (artigo 142, § 1º).

26 Código de Processo Civil Comentado Artigo por Artigo. 5ª. Ed. Ver. Atual. 2020. Salvador: Editora Juspodivm, pág. 874.

27 Curso de Direito Civil – Parte Geral. 42ª. Ed – São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 32.

28 Curso de Direito Civil – Parte Geral, ob. cit, pág. 34.

29 Curso..., ob. cit, pág. 34.

30 ADI 3653/DF, Relator ALEXANDRE DE MORES,julg. 30/08/2019

31 “RURÍCOLA. PRESCRIÇÃO. CONTRATO DE EMPREGO EXTINTO. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 28/2000. INAPLICABILIDADE (alterada) – DJ 22.11.2005. O prazo prescricional da pretensão do rurícola, cujo contrato de emprego já se extinguira ao sobrevir a Emenda Constitucional n. 28, de 26/05/2000, tenha sido ou não ajuizada a ação trabalhista, prossegue regido pela lei vigente ao tempo da extinção do contrato de emprego.”

32 Segunda Turma, AgReg no Recurso Extraordinário com Agravo n. 1.252.121-Roraima. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julg. 22.03.2001. Tratou-se de decidir se a alteração da Lei n. 12.891/2013, ao deixar de exigir a comunicação de desfiliação partidária, retirou a relevância jurídica do falso cometido pelo interessado para essa finalidade em 2006. Consta do v. acórdão: “Entretanto, como bem delineado pela decisão da Corte Eleitoral, a tentativa de o recorrente afastar o objeto „documento‟, não se presta para excluir o elemento normativo do tipo de falsidade ideológica. Isso porque a efetiva ocorrência de todos os elementos do tipo penal deve ser avaliada de acordo com a lei vigente à época dos fatos, sendo irrelevante alteração posterior naqueles elementos que estavam presentes quando do cometimento do crime. O processo de análise da dupla filiação partidária está contido no conjunto da jurisdição cível, no qual impera o princípio do tempus regit actum. Ou seja, na análise de um fato determinado, deve ser aplicada a lei vigente à sua época”.

REFERÊNCIAS

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OLIVEIRA, José Roberto Pimenta e GROTTI, Dinorá Adelaide Museti” in Interesse Público, Belo Horizonte, ano 22, n. 120, mar./abr. 2020.

 

*Evelise Pedroso Teixeira Prado Vieira é Procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo


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